quinta-feira, 18 de junho de 2009

Jean Charles: Um Brasileiro Sem Nenhum Heroísmo

Na manhã de 22 de julho de 2005, o mineiro Jean Charles de Menezes chegou à estação Stockwell do metrô, no sul de Londres. Segundos depois de entrar no vagão, ele foi morto a tiros por agentes da polícia inglesa, que suspeitava que ele fosse um terrorista. Poucos dias depois, provou-se que Jean Charles não tinha ligação com grupos radicais islâmicos que naquele ano haviam cometido atentados na capital inglesa. Jean Charles era apenas mais um das centenas de milhares de imigrantes brasileiros a tentar ganhar a vida em Londres. A história ocupou o noticiário, causando desconforto diplomático. A polícia inglesa lamentou o ocorrido, mas nenhum dos envolvidos foi punido.
Histórias assim são um prato cheio para o cinema: um inocente estrangeiro morto por uma polícia preparada. Prato cheio e arriscado. Pois é muito fácil transformar o personagem real em herói e mártir, vítima da injustiça e intolerância do Primeiro Mundo com os imigrantes do Terceiro. O diretor Henrique Goldman resolveu encarar o desafio e filmou a história. O resultado pode ser visto neste mês, quando estreia Jean Charles, coprodução Brasil/Inglaterra.

O ANTI-HERÓI

O filme acerta ao não tratar Jean Charles como herói. Ao contrário, às vezes ele lembra muito mais o célebre anti-herói brasileiro: um homem que ganha a vida como eletricista, faz bicos e consegue vistos ilegais para brasileiros. Há um traço de pilantragem à maneira nacional que margeia a criminalidade e um bem montado quadro dessa comunidade, onde muitos não falam inglês porque só vivem entre seus conterrâ­neos e só saem de casa para o trabalho.
Outro risco que Goldman corria era escalar Selton Mello para interpretar Jean Charles. Selton é, indiscutivelmente, um dos mais talentosos atores brasileiros de sua geração, mas muito mais afeito a comédias do que a dramas, em que se pede mais comedimento. E, por melhor que seja, é, ainda, um ator marcado por um conjunto de trejeitos que torna seus personagens quase sempre parecidos. Desta vez, contudo, o ator mostrou grande amadurecimento, pois incorpora o personagem com ótima atuação sem perder totalmente suas características.
Ao seu lado, há também a correta interpretação de Vanessa Giácomo, como a prima de Jean, Vivian, que chega a Londres para juntar dinheiro para o tratamento da mãe, e a ótima atuação de Luis Miranda, como Alex, outro primo, que luta por justiça depois da morte do eletricista. Sem cair no maniqueísmo e fazer de Jean um mártir brasileiro, o filme dá a verdadeira dimensão da tragédia e, por isso, acerta em cheio.

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